Arquivo para março de 2011
Nem melhor, nem pior
O Tribunal de Justiça do Amazonas mostrou desempenho mediano no levantamento feito pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).Em 2010, o tribunal julgou 77,48% dos processos apresentados no ano
TJ amazonense não foi o pior no levantamento do Conselho Nacional de Justiça. A liderança desse ranking é ocupada por tribunais do Nordeste.
O Tribunal de Justiça da Bahia conseguiu julgar apenas 58,40% dos processos apresentados em 2010. O TJ do Rio Grande do Norte só avançou em 9,42% do estoque de processos antigos, que aguardam julgamento.
O TJ do Estado do Pará teve o melhor desempenho: 164,68 de processos julgados.
Abaixo, o gráfico com a perfomance de todos os Tribunais do País.
Justiça nega suspensão de aulas por motivos religiosos
Ao analisar apelação de estudantes contra sentença que negou pedido que objetivava compelir o IFG – Instituto Federal de Goiás a oferecer-lhes prestação alternativa para as aulas ministradas aos sábados, por serem membros da Igreja Adventista do Sétimo Dia, o TRF da 1ª região entendeu que a CF/88 não prescreve o dever estatal de facilitar o acesso às prescrições, ritos e rituais de cada religião. Assim, negou o pedido e manteve a sentença de primeira instância.
Os estudantes apelaram para o TRF após a juíza de primeira instância entender que não há como obrigar a instituição de ensino a substituir a frequência às aulas por atividades alternativas ou abonar as faltas, pois isso caracterizaria privilégio, em detrimento dos demais alunos, violando-se o princípio da isonomia. Para a magistrada, o abono de faltas encontra óbice na lei 9.394/96
No recurso ao TRF, os estudantes sustentaram que, como adventistas, dedicam às atividades religiosas, espirituais ou humanitárias o período que vai de sexta-feira, a partir do pôr do sol, até sábado, no mesmo horário. Assim, não estariam buscando privilégios, mas apenas alternativas para as aulas ministradas nos horários citados.
A desembargadora Federal Selene Maria de Almeida, relatora do processo, explicou em seu voto que a lei 9.394/96 estabelece a obrigatoriedade de frequência de alunos e professores (art. 47, § 3º), salvo nos programas de educação a distância, o que não é o caso.
A desembargadora explicou que, embora a CF/88 proteja a liberdade de crença e de consciência e o princípio de livre exercício dos cultos religiosos, não prescreve, em nenhum momento, o dever estatal de facilitar, propiciar, promover o exercício ou o acesso às prescrições, ritos e rituais de cada religião. De fato, estabelece apenas o dever do Estado de proteger os locais de culto e suas liturgias.
Selene Maria de Almeida acredita que o requerimento dos impetrantes não ofende o interesse público, mas lembrou que a imposição de frequência mínima às aulas por parte do IFG, sob pena de reprovação, visa apenas a obedecer à previsão legal e disposições constitucionais. É, portanto, uma norma geral, aplicável a todo o corpo discente, independentemente da religião de cada um, não caracterizando violação a direito líquido e certo do impetrante. Dessa forma, a magistrada entendeu não haver ofensa à liberdade de crença.
Para a relatora, quando se inscreveram no concurso vestibular, os impetrantes tinham ciência dos horários das aulas e nem por isso buscaram ingressar em curso diurno ou curso que, de qualquer outra forma, não os forçasse a assumir compromisso escolar às sextas-feiras à noite e aos sábados. Conforme avalia a desembargadora, o fato de estarem impedidos de frequentar aulas às sextas-feiras à noite e aos sábados, por motivos religiosos, é ônus decorrente de sua opção, e não há de ser creditado à faculdade.
CNJ uniformiza horário de expediente dos Tribunais
Resolução do Conselho Nacional de Justiça determina que o expediente dos órgãos jurisdicionais em todo o país para atendimento ao público deverá ser de segunda a sexta-feira, das 9h às 18 horas.
A decisão foi tomada a partir de pedido de providências apresentado pela OAB de Mato Grosso do Sul em razão dos diferenciados horários de expediente adotados pelos tribunais em todo o país, o que vinha impondo prejuízos ao jurisdicionado. Nesse Estado (MS), o expediente inicia às 12 horas e finda às 19 horas.
A resolução é assinada pelo presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso, e acrescentará o 3º à redação do artigo 1º da Resolução nº 88, de 08 de setembro de 2009.
O parágrafo 3º está assim redigido: “Respeitado o limite da jornada de trabalho adotada para os servidores, o expediente dos órgãos jurisdicionais para atendimento ao público deve ser de segunda a sexta-feira, das 09:00 às 18:00 horas, no mínimo”.
O temo “no mínimo” confunde e leva ao entendimento que a jornada de trabalho será de 9 horas diárias. Penso eu que a finalidade da mudança é delimitar o horário de funcionamento dos Tribunais no espaço de tempo compreendido entre às 9 e 18 horas (evitando horários esdruxulos, como o de MS), respeitada a atual carga horária do servidor. Assim, o horário de expediente do TJ/AM que inicia às 8 horas e finda às 15 horas, passaria a ter seu inicio às 9 horas e término às 16 horas.
Ou, então, numa outra interpretação, os TJ teriam que funcionar ininterruptamente entre às 9 e 18 horas, acarretando a entrada e saída de funcionários em horários distintos. Um grupo de servidores cumpriria jornada das 9h às 16h e outro grupo das 11 às 18h, haja vista a expressão “respeitado o limite de jornada de trabalho adotada para o servidores” constante no início da redação do citado dispositvo.
É isso mesmo ou eu estou delirando?
Coração civil
Quero a utopia, quero tudo e mais,
Quero a felicidade dos olhos de um pai,
Quero a alegria, muita gente feliz,
Quero que a Justiça reine em meu País.
Trecho da canção “Coração Civil”, autoria de Milton Nascimento
Avanços na reforma da Justiça
Recente seminário promovido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), no Rio de Janeiro, reuniu a cúpula do Executivo e do Judiciário, além de juristas e pesquisadores, com o objetivo de discutir estratégias para acelerar o processo de modernização da Justiça brasileira, que foi iniciado em 2004 com a aprovação da Emenda Constitucional 45.
O evento contou com a participação do ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, do vice-presidente da República, Michel Temer, e do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso. Este último discutiu uma medida a ser adotada mediante Emenda Constitucional prevendo que as decisões de segunda instância da magistratura possam ser executadas imediatamente, independentemente das partes derrotadas poderem interpor recursos no Superior Tribunal de Justiça e no STF. A mudança valeria tanto para a área cível quanto para a área penal.
O objetivo é fortalecer os Tribunais de Justiça (TJs) e os Tribunais Regionais Federais (TRFs), agilizando a execução dos acórdãos e reduzindo o número de ações encaminhadas à mais alta Corte do País. “Os processos levam anos, às vezes décadas, e essa morosidade é a principal queixa da sociedade. A causa principal dos atrasos é a multiplicidade de recursos e o sistema de quatro instâncias em vigor”, afirmou Peluso.
A proposta, que vai ser discutida pelos Três Poderes, até chegar a um pacto que assegure sua aprovação pelo Congresso, foi recebida com reservas por juristas, magistrados e pesquisadores, além do ministro da Justiça e do vice-presidente. Temer afirmou que a execução imediata de uma decisão de segunda instância, sem que o caso tenha sido julgado no mérito em caráter definitivo por uma Corte superior, pode acabar criando situações de fato e prejudicando o direito de defesa da parte derrotada nos TJs e TRFs, além de inviabilizar eventuais decisões contrárias do STF. Na tréplica, Peluso afirmou que a maioria dos processos que chegam à Corte já foi objeto de duas decisões em instâncias inferiores, o que “satisfaz o princípio do devido processo legal”, e disse que o STF tem recusado, em média, 80% dos recursos a ele encaminhados.
No debate, três pesquisadores da FGV – Joaquim Falcão, Pablo Cerdeira e Diego Werneck – apresentaram os resultados de sua mais recente pesquisa sobre essa Corte. Segundo eles, 91,6% dos processos que chegaram ao STF, entre 1988 e 2010, foram recursos judiciais. E 90% desses recursos foram impetrados pelo poder público – principalmente autarquias da administração direta federal e empresas sob controle da União. Pela ordem, os maiores litigantes são a Caixa Econômica Federal, o Instituto Nacional do Seguro Social, o Banco Central e o Banco do Brasil. Fora da área federal, os que mais recorrem são os Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e a Prefeitura de São Paulo. Na iniciativa privada, a empresa que mais recorre ao STF é a Telemar.
A revelação mais surpreendente da pesquisa é que 5% dos casos que vão parar no Supremo – o equivalente a 57 mil processos – tiveram origem nos Juizados Especiais de Pequenas Causas. Trata-se de um paradoxo, pois essas Cortes foram criadas para julgar causas de pequeno valor com base em rito sumário. A pesquisa da FGV revela assim que os Juizados Especiais se burocratizaram progressivamente, deixando de cumprir seu papel de agilizar a tramitação das ações judiciais mais corriqueiras. Em outras palavras, os Juizados acabaram envolvidos no mesmo sistema protelatório que é a principal marca do Judiciário brasileiro. E é por isso que os projetos de reforma dos Códigos de Processo Civil e Penal precisam criar diques, enxugando drasticamente o número de recursos, para evitar a sobrecarga dos tribunais superiores.
A modernização da legislação processual e a reforma do Judiciário são decisivas para aumentar a segurança jurídica no País. O seminário da FGV, que teve a participação dos mais diversos setores da sociedade e do poder público, foi uma contribuição importante para o aperfeiçoamento do Estado de Direito.
Editorial do Jornal Estado de São Paulo, edição de 28/3/11.